Alessandra e Tiago na Aldeia Kaaguymirim/RS - Foto: Lufe Torres
PESQUISA & DESIGN DO IMAGINÁRIO GAÚCHO BRASILEIRO
Oiamo é um atelier nômade do Rio Grande do Sul nomeado oficialmente pelo comitê Global Sustainable Association (GSA) para o Kyoto Global Design Awards 2023 na categoria “Best 100” e vencedor do Prêmio de Design Bornancini na categoria Impacto Econômico e Cultural. A marca foi criada pelo designer Tiago Braga que se dedica a mapear e atualizar a memória e a energia da ancestralidade de comunidades originárias do extremo Sul do Brasil. Através de uma releitura da matéria-prima natural e reciclada no resgate dos processos artesanais, que estão desaparecendo. Mobilizando coletivos de mulheres gaúchas, gerando renda e autoestima em uma importante zona de fronteira, com características únicas, formada durante mais de três séculos de miscigenação de povos ibéricos em interação com diferentes grupos indígenas, pretos e imigrantes europeus com grande influência do templadismo uruguaio e argentino. A metodologia utilizada pelo designer Tiago Braga, chamada por ele de “Design Ancestral”, traz uma releitura das técnicas tradicionais ancestrais em projetos de pequenas coleções cocriadas com os coletivos de artesãs nos locais onde elas vivem.
Croquis de estudos no atelier de Tiago em Porto Alegre/RS - Foto: Lufe Torres
As criações transitam das artes manuais milenares - tricô, tear, crochê, bordado, cestaria, marcenaria. Guardam um pouco da história de territórios que se afirmam e se abarcam, tal qual nossa cultura diversa, mesclando formas, materiais, cheiros e cores - do tradicional ao contemporâneo. Ampliando a prática do artesanato e do modo de vida ancestral, como valor a ser resgatado.
Rosa Sales, etnia Kaingang - Foto: Divulgação
Tradições expandidas
Nas décadas de 80 e 90, o processo de industrialização modificou muito o mercado substituindo as fibras naturais pelas fibras sintéticas, os trabalhos manuais e artesanais se tornaram obsoletos, desvalorizados. Pode-se dizer até que o desenvolvimento do design erudito e industrial no Brasil se deu em campos opostos as tradições artesanais. A Oiamo surge na contramão do fenômeno de industrialização e da “boa forma internacional” no design desconectado das culturas locais em prol da forma “adequada” para se repetir indefinida e independentemente do tempo e do lugar.
A partir de imersões realizadas nas comunidades, o designer Tiago Braga centra seus estudos nas práticas, saberes e valores tradicionais, mapeando as características que constituem o modo de vida das mulheres artesãs. O processo criativo respeita a expressividade do tempo, da matéria-prima local e simbólica, na integralidade do seu manejo e espiritualidade, que são transmitidos através da oralidade, de geração em geração, manifestados pelo saber-fazer guardado na voz do coração. Para a tecelagem e o bordado manual, tradicionais do Sul para produção de palas e ponchos, Tiago traz textura única das fibras vindas de resíduos da indústria têxtil. O território, as mulheres, o saber-fazer ancestral junto do “olhar estrangeiro” do designer pesquisador se tornam grandes semantizadores de novos artefatos culturais que ampliam memórias para além do seu território cultivado.
Marina no tear trabalhando com tecido de algodão reciclado em Gravataí/RS - Foto: Lufe Torres
Mirian tricotando com fibras naturais em Osório/RS - Foto: Lufe Torres
Reconhecimento do mercado
Em 2022 a Oiamo recebeu Ouro no Prêmio Bornancini na categoria Impacto Positivo Econômico e Cultural, uma premiação em nível nacional promovida pela Associação dos Profissinais de Design do RS - APDESIGN. As coleções da Oiamo integram importantes curadorias no Brasil e no exterior, como na Mac Design Miami, Feira na Rosenbaum. Realizou parcerias com profissionais consagrados como Marcelo Rosenbaum, criando peças para a Farm Rio de Nova Iorque, e em projetos com curadoria de Constanza Pascolato, Maurício Arruda, Michel Lott e Stephanie Ribeiro. Presente em diversas mostras como DW! São Paulo Design Week, Design Oriundi 2020, com curadoria de Joice Joppert, Casa Cor, entre outras.
Karine Portela tecendo fio de rede de pesca na Colônia de Pescadores Z3/RS - Foto: Lufe Torres
Projeto Serra do Mar
Arroio Grande fica no litoral do Rio Grande no Sul em meio a Mata Atlântica, emoldurado por montanhas e banhado pelo mar, por isso chamado de Serra do Mar é formado por muitos imigrantes, principalmente italianos que em ali se estabeleceram. A economia local é eminentemente agrícola tem como produção primária os produtos hortigranjeiros como a banana. Por isso, a fibra de bananeira emerge como potencial geradora de renda às mulheres rurais.
O Projeto Caraá traz um novo olhar para o artesanato de subsistência do imaginário rural das famílias desde lugar, e aumenta o potencial de geração de renda para estas comunidades. O cesto de palha que, originalmente era visto apenas como utilitário para uso no dia-a-dia torna-se um objeto que guarda uma cultura. Essa alternativa mobilizou uma rede de mulheres que trançam a fibra que antes era descartada pelos os donos das plantações. Com isso, expandem a prática do artesanato e do seu modo de vida, como ativo a ser preservado, protegido e tornado valorizado no mundo contemporâneo.
Rosane costurando cestaria de fibra de bananeira no Caraá/RS - Foto: Lufe Torres